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Ciência

Contracepção masculina é "um desafio" mais cultural do que científico

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Em Fevereiro, uma equipa de cientistas financiados pelo Instituto Nacional de Saúde norte-americano publicou um artigo em que dá conta de avanços positivos na busca por uma pílula masculina eficaz. Para a professora da Universidade do Minho,  Cristina Martins, até agora a contracepção masculina não teve o mesmo investimento que a feminina não por razões científicas, mas sobretudo pela forma diferente como a sociedade vê homens e mulheres.

A contracepção masculina continua a ser um tabu da sexualidade dos homens.
A contracepção masculina continua a ser um tabu da sexualidade dos homens. AP - Wong Maye-E
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O avanço que pode levar à primeira pílula contraceptiva viável para os homens foi descrito na revista científica Nature Communications em Fevereiro deste ano. Os testes em ratinhos mostraram-se eficazes com esta pílula a recorrer a uma técnica que imobiliza os espermatozoides, fazendo com que a ejaculação não leve à fertilização dos óvulos femininos.

Mais do que um desafio científico, a dificuldade em encontrar uma pílula masculina é um desafio da sociedade moderna, já que cria uma desigualdade entre homens e mulheres na prevenção da contracepção, deixando muitas vezes esta responsabilidade exclusivamente no campo feminino.

Este novo medicamento pode ser uma boa notícia, segundo Cristina Martins, professora universitária e directora do Curso de Enfermagem na Universidade do Minho, mas é preciso um maior investimento na educação sexual e uma desconstrução dos estereótipos de género desde a mais tenra idade para que os homens se tornem actores activos não só da contracepção, mas também da sua sexualidade e da parentalidade.

"Há muita dificuldade em termos de aceitação cultural e social, é um desafio, o próprio financiamento e a pesquisa está mais limitada ou foi mais limitada ao longo das décadas do que a feminina. A verdade é que a contracepção surgiu quer para a mulher, quer para o homem, na mesma altura, mas não evoluiu da mesma maneira. A indústria farmacêutica teve mais desinteresse em relação à contracepção masculina do que feminina, justificada por razões de ordem política, cultural e biológica. Acho que há também uma questãomuito séria do estigma social associado às questões de género, funções e responsabilidade de homens e mulheres nesta matéria", declarou a professora universitária.

Esta falta de partilha na contracepção acaba por fazer com que a responsabilidade caia sobre só sobre a mulher, um paradigma que deve mudar com a introdução de uma pílula viável para o homem.

"É importante reconhecer que a contracepção é responsabilidade partilhada de ambos, quer homens quer mulheres, e estes deviam ter uma papel activo na prevenção. Esta falta de disponibilidade no mercado de contraceptivos masculinos, corrobora isto, mas se eles aparecerem pode ajudar a equilibrar esta carga de responsabilidade entre homens e mulheres", indicou Cristina Martins.

A contracepção masculina está também muito ligada à virilidade, duas questões muitas vezes confundidas devido aos estereotipos sobre a sexualidade masculina.

"As questões da virilidade são muito sérias e colocam barreiras psicológicas aos homens. Há culturas em que isto está muito vincado, com os homens a terem muitas questões sobre se a contracepção afecta a sua fertilidade  a longo prazo, deixa de ser um macho e perturbar a sua visibilidade na sociedade. é um tabu que implementa uma certa falta de adesão dos homens ao métodos contraceptivos", 

Para resolver esta questão, a docente universitária considera que a promoção da educação sexual é a única solução.

"Há a questão da promoção da educação social e do planeamento familiar que pode ajudar à conscencialização da importância da contracepção e do papel dos homens neste processo. Este incentivo para que os homens assumam este cuidado é necessário que exista desde muito cedo nas escolas e com uma real inclusão no planeamento reprodutivo", concluiu.

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