Acesso ao principal conteúdo
Vida em França

“Geoffroy Lejeune chega bastante fragilizado ao JDD”

Publicado a:

Após quarenta dias de paralisação e seis domingos sem publicação, os funcionários do Journal Du Dimanche e a direção do grupo Lagardère News anunciaram que chegaram a um acordo esta terça-feira, dia da entrada em funções do novo director Geoffroy Lejeune, cuja nomeação é contestada pelos jornalistas. Em entrevista à RFI, Carlos Pereira, director do LusoJornal, admite que Geoffroy Lejeune chega à direcção bastante fragilizado, uma situação que mancha a entrada no Jornal du Dimanche. 

Geoffroy Lejeune, novo director do Jornal Du Dimanche.
Geoffroy Lejeune, novo director do Jornal Du Dimanche. © JOEL SAGET / AFP
Publicidade

Após quarenta dias de paralisação e seis domingos sem publicação, os funcionários do Journal Du Dimanche e a direção do grupo Lagardère News anunciaram que chegaram a um acordo esta terça-feira, dia da entrada em funções do novo director Geoffroy Lejeune, cuja nomeação é contestada pelos jornalistas.

Em comunicado, os jornalistas reconheceram que "perderam a batalha com a direcção", sublinhando, porém, que “este combate foi feito em respeito aos leitores e à publicação emblemática conhecida pela qualidade de informação e respeito pelos princípios deontológicos”. Segundo o jornal Libération, o acordo prevê um salário mínimo de três meses para os contratos mais recentes e dois meses de vencimento por ano para quem tiver mais de dois anos. A partir dos quinze anos de antiguidade, a administração propõe o mínimo legal, ou seja, um mês por ano de antiguidade. Os colaboradores terão ainda direito a um cheque de 5 mil euros que será depositado na conta de formação profissional, tendo ainda uma isenção de actividade, paga por três semanas, para permitir que organizem a partida sem ter que escrever uma única linha sob a direcção de Geoffroy Lejeune.

RFI:Que legitimidade tem Geoffroy Lejeune para coordenar uma equipa do Journal Du Dimanche?

Carlos Pereira, director do LusoJornal: Ele já estava fragilizado antes e agora ficou ainda muito mais. Os jornalistas tentaram evitar a sua nomeação e não conseguiram. Falharam essa operação, apesar de terem feito uma greve de muitos dias, levando a perdas de salários e, provavelmente, não podiam ir mais longe. Todavia, o resultado é que terão de trabalhar com ele - os que ficarem. Isto, porque há muitos que vão abandonar. Esta situação mancha, evidentemente, a entrada do novo director num jornal que já tem uma história muito grande.

Uma das exigências dos jornalistas era a de que a direcção do JDD se comprometesse a impedir todas as publicações “racistas, xenófobas e homofóbicas”, um pedido que foi recusado. Geoffroy Lejeune foi afastado da publicação Valeurs Actuelles, acusado de ter radicalizado o seu discurso. É conhecido pelo apoio que deu a Eric Zemmour, candidato às eleições presidenciais em 2023 e é próximo de Marion Maréchal, figuras políticas ligadas a uma direita mais extremista. O que se pode esperar deste jornal em termos editoriais?

Existe aqui um problema de fundo sobre a verdadeiro papel do trabalho de um jornalista. Um jornalista deve procurar sempre a verdade, deve dar as duas versões de uma história, deixando ao leitor a possibilidade de fazer a sua própria opinião. O que se passa muitas vezes, isso acentua-se, é que os jornais e os jornalistas começam a ter uma opinião. A opinião já não está ligada ao facto de informar. No caso de Geoffroy Lejeune, ele exagera na sua opinião.

Nos últimos anos, ele tem veiculado a sua opinião racista, radicalizada e, evidentemente, é isto que vai continuar a fazer. Provavelmente até foi por isso que foi escolhido para vir dirigir este jornal.

O JDD pertence ao grupo Lagardère News que se prepara para ser absorvido pelo grupo Vivendi, do empresário Vicent Bolloré, que detém já vários meios de comunicação. Muitos analistas acusam Vincent Bolloré de estar a levar a cabo uma revolução cultural com o objectivo de banalizar a mensagem política de extrema direita e também de estar a preparar as próximas presidências. Há esse risco?

Sim, existe. Se nos lembrarmos, Geoffroy Lejeune começou por ser um assessor parlamentar e depois, a um dado momento, disse que era mais importante ser jornalista do que legislador.

Vincent Bolloré está a fazer isto. Está a utilizar os meios de comunicação, que vai comprando, para passar as suas e controlar a imprensa. As ideias de Vincent Bolloré e Geoffroy Lejeune são muito próximas. Ele escolheu-o com um propósito, percebendo que os média têm mais força do que os deputados. [Bolloré] decidiu controlar os média, de forma a controlar o resto.

Uma publicação precisa de meios financeiros para se manter. Esta dependência fragiliza os meios de comunicação diante de empresários milionários? 

Certamente que sim. Se não forem os anunciantes, os jornais não podem existir. A simples venda de um jornal não é suficiente e, por outro lado, há cada vez menos vendas de jornais. As pessoas habituaram-se a ter as coisas gratuitamente. Cada vez estamos mais dependentes, digo estamos, porque o LusoJornal também está dependente de quem nos compra publicidade. Se não houver publicidade, não há meios de comunicação. Há sempre aqui uma dependência e não é muito fácil ser independente. Não é muito fácil escrever um artigo sobre um empresário que nos compra publicidade. Essa situação já aconteceu no LusoJornal e tivemos algumas retiradas de publicidade, mas nada que não se tivesse ultrapassado. Eu suponho que no Jornal Du Dimanche a publicidade represente metade das receitas do jornal, as vendas não são suficientes e estamos a falar de um jornal de grande tiragem.

Uma proposta de lei de vários partidos franceses visa, entre outros, proteger a independência das redações. Esta propostas de lei é suficiente?

Não, porque depende de cada redacção. O próprio Presidente da República, Emmanuel Macron, veio propor, suponho que no mês de Setembro, os estados gerais da independência da imprensa. É muito interessante haver estas tomadas de decisão e existirem estes debates, mas depois debate-se é nas redacções. Se existe uma redacção com fricções, essa liberdade de imprensa não vai existir. O director vai dar sugestões de assuntos que, provavelmente, não vão interessar aos jornalistas. Ou o contrário. Haverá tensões.

Que papel deve ter o estado francês? Intervir ou manter-se à margem?

Deve intervir. É importante haver este debate, mas depois os órgãos devem ter a sua liberdade. Nós não podemos estar aqui a dizer que há uma aproximação muito grande entre os média e o poder e, por outro lado, dizer que o poder devia ter uma intervenção maior. Não faz sentido. É necessário deixar aos média a sua própria organização. Devemos é estar atentos para que não existam derrapagens racistas, nem homofóbicas e que nem sejam toleradas.  

 

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe toda a actualidade internacional fazendo download da aplicação RFI

Ver os demais episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual pretende aceder não existe ou já não está disponível.