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#Morte de Peter Brook

"Peter Brook rejuvenesceu-me em acreditar que o teatro pode ajudar muito"

O encenador Peter Brook, um dos mais influentes do século XX, morreu no sábado, com 97 anos. O actor e encenador português João Mota trabalhou com ele nos primeiros anos do Centro Internacional de Criação Teatral, em Paris, e recorda o imenso legado que o mestre lhe deixou. "Peter Brook rejuvenesceu-me em acreditar que o teatro pode ajudar muito", recorda o fundador do Teatro da Comuna, em Lisboa.

Encenador Peter Brook
Encenador Peter Brook AFP/File
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Peter Brook nasceu no Reino Unido mas viveu 50 anos em Paris, 35 à frente do teatro parisiense Les Bouffes du Nord.

No final de Junho, o encenador João Mota contava à RFI como aprendeu tanto com Peter Brook e a sua teoria do "espaço vazio". Um mestre que, segundo ele, também aprendeu com a essência do teatro do próprio Molière– numa conversa a propósito dos 400 anos do dramaturgo francês. Precisamente no ano em que o mundo das tábuas recorda o génio de um dos pais da comédia francesa, a França perde um dos encenadores que mais renovou o teatro contemporâneo.

João Mota trabalhou com ele nos primeiros anos do Centro Internacional de Criação Teatral, em Paris, uma experiência que juntou várias nacionalidades, recordando que uma das lições de Peter Brook era manter-se fiel a si próprio. O centro chegou a mudar-se três meses para o actual Irão para construir "A Conferência dos Pássaros", uma adaptação de um poema persa medieval que estreou em Paris em 1976.

Peter Brook reinventou a arte da encenação, ao privilegiar formas depuradas em vez de cenários tradicionais. Em 1968, o encenador iniciou o período experimental marcado pela teoria do "espaço vazio".

João Mota explica : "Quando o Peter Brook escreve o livro 'O Espaço Vazio' ele refere-se ao actor também. O actor tem que estar vazio para poder habitar um espaço vazio. Se ele não está vazio, o espaço está cheio de porcaria e de mediocridade dos actores. Criar o espaço vazio dos actores e com o espaço quase vazio, aí é teatro e aí é uma cumplicidade com o público. Basta um chão, uns móveis, às vezes um pormenor simbólico porque o público não é estúpido."

João Mota poderia ter ficado a trabalhar com Peter Brook em Paris, mas preferiu voltar para Portugal, onde o teatro era ainda muito académico e marcado por anos de fascismo. Pouco depois, o actor português fundava o Teatro da Comuna, em Lisboa, o teatro que este ano fez meio século. "O Peter Brook rejuvenesceu-me em acreditar que o teatro pode ajudar muito na simplicidade, nessa troca com os homens. Ser simples é a coisa mais difícil que há na vida", conta. Em Paris, ficava a sua irmã, a actriz Teresa Mota, que casaria com o dramaturgo francês Richard Demarcy. O filho de ambos, Emmanuel Demarcy-Mota é director do Théâtre de la Ville de Paris e actualmente presidente da Temporada Cruzada França-Portugal.

Oiça aqui um excerto da conversa sobre Peter Brook.

02:18

João Mota sobre Peter Brook

Oiça aqui a conversa em torno dos 400 anos de Molière e do teatro sem artifícios.

13:10

João Mota e Molière - A luta pela liberdade

Por sua vez, Tiago Rodrigues, o encenador e dramaturgo português que passou a dirigir este ano o Festival de Avignon, escreveu nas redes sociais que Peter Brook “mudou as regras do teatro para melhor”. Foi em 1985 que o encenador britânico estreou, em Avignon, "Mahabharata", um espectáculo de nove horas a partir do poema épico indiano.

A poucos dias do Festival de Teatro de Avignon, o director cessante, Olivier Py, disse, em entrevista à France Inter, que "Brook é muito mais do que um encenador de teatro, é uma verdadeira lenda", que adoptou a fórmula de Shakespeare "o palco é um mundo e o mundo é um palco" e integrou nos seus elencos pessoas de todas as culturas e nacionalidades.

O jornal francês Libération fala em um encenador "com uma obra imensa, marcada por Shakespeare, teórico de uma escrita cénica sem artifícios, reduzida à quintessência do texto e quase sem cenário".

Le Monde escreve que "Brook leva com ele uma das mais importantes aventuras teatrais da segunda metade do século XX, que fez do teatro um instrumento fabuloso para explorar o ser humano em todas as suas dimensões, através de espectáculos lendários".

O jornal português Público fala no "encenador britânico que reinventou o teatro a partir de Paris". Peter Brook salvou o teatro Bouffes du Nord, que estava destinado à demolição, e aí ficou 35 anos, para o deixar em 2010, aos 85 anos, apesar de ter continuado a assinar produções até recentemente. O encenador morreu no sábado, em Paris, onde vivia desde 1974.

Peter Brook revisitou várias vezes o teatro shakespeariano, mas trabalhou também textos de Jean Cocteau, Tchekhov, Beckett, Alfred Jarry, Peter Weiss, T.S. Elliot, Truman Capote, entre outros.

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