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Maputo acolhe Bienal de Dança Africana

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Até 26 de Novembro, Maputo é a capital da dança contemporânea com a 10ª edição da Bienal KINANI que também acolhe a Bienal de Dança Africana. Uma bienal a dobrar e vários coreógrafos moçambicanos em cartaz mostram que Moçambique está “a viver um momento histórico” no mundo da dança, diz Quito Tembe, director da KINANI, sublinhando que a dança é “um lugar de intervenção” e que a busca das raízes e a luta contra diversos tipos de opressão são algumas das linhas de força da programação.

Quito Tembe, Director artístico da Bienal Kinani
Quito Tembe, Director artístico da Bienal Kinani © Carina Branco/RFI
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Dez anos de muito trabalho e “sorte”. É assim que Quito Tembe começa por explicar o facto de a Biennale de la Danse en Afrique [Bienal de Dança em África] acontecer, este ano, em Maputo e ser organizada pela KINANI - Bienal Internacional de Dança Contemporânea de Maputo que este ano realiza a sua 10ª edição.

Para nossa sorte, fomos o país elegido para receber a bienal [de dança] do continente africano”, conta o director artístico da Kinani que é também o presidente da comissão artística da Biennale de la Danse en Afrique.

“[O convite] surge no âmbito do reconhecimento do trabalho que estamos a fazer para o continente. Nada mais justo que estarmos a celebrar a 10ª edição da nossa bienal e durante todo este período foi cobrir um pouco de tudo o que é do continente e não só. Por isso, digo que Moçambique acolher esta bienal surge no âmbito do reconhecimento de todo este percurso da bienal”, explica o curador.

Duas bienais em uma transformam a capital de Moçambique também na capital da dança durante duas semanas: a primeira arrancou a 13 de Novembro com artistas de várias geografias; a segunda só tem nomes africanos e decorre de 20 a 26 de Novembro.

A maratona de espectáculos começou na segunda-feira. Na programação, havia peças do coreógrafo português Victor Hugo Pontes, da moçambicana Kátia Manjate, do brasileiro Catol Teixeira, da companhia suíça Cie 7273, da plataforma Estúdios Victor Córdon e da companhia norte-americana Anikaya, entre outras.

A partir de 20 de Novembro e até dia 26, entra em palco a programação da Biennale de la Danse en Afrique. Há espectáculos dos coreógrafos moçambicanos Horácio Macuácua, Pak Ndjamena, José Jalane, Janeth Mulapha, Idio Chichava, Mai Juli, Panaibra Gabriel e Carolina Manuel. Há, também, peças do cabo-verdiano Djam Neguim, dos sul-africanos Gregory Maqoma, Nelisiwe Xaba, Albert Ibokwe Khoza e Mamela Nyamza, dos malianos Lassina Koné e Daouda Keita, do marroquino Mohamed Lamqayssi, do camaronês Zora Snake, dos nigerianos Aiyegbeni Deborah e Qudus Onikeku, do tanzaniano Samwel Japhet, do togolês Kossivi Afiadegnigban e do mauriciano Stephen Bongarçon.

Quito Tembe sublinha que “a bienal do continente africano - e o país que a acolhe - têm o privilégio de receber companhias de quase todos os cantos do continente”, o que leva para Maputo “centenas de profissionais”.

O tema desta bienal é “Para além”, um salto para alargar horizontes e despertar esperanças através da dança.

“Para mim, o ‘Para além’ é para além de tudo aquilo que vivenciamos hoje, não só no continente africano, mas no mundo. Para além das mudanças climáticas, o que é que há? Para além das guerras, o que é que há? Para além da emigração? Para além dos conflitos? É essa a preocupação: tentar ir, um pouco, para além de tudo isto. A curadoria foi tocar estes aspectos e trazer estas reflexões e estas provocações do que há para além de todos estes temas”, acrescenta Quito Tembe.

A busca das raízes e a luta contra diversos tipos de opressão são também linhas de força deste cartaz porque “é importante olhar para a dança não somente como lugar do ‘estético belo’ mas como um lugar de intervenção”.

Esta Bienal de Dança em África tem peças de vários coreógrafos moçambicanos, alguns já com trabalho reconhecido “para além” de Moçambique e outros que começam a destacar-se agora e também a desbravar terreno “para além” do continente. Algo que é revelador da vitalidade da dança em Moçambique, não apenas como criação visual, mas como fábrica de pensamento e reflexão sobre a própria arte e o seu papel de intervenção.

“Eu acho que [a dança em Moçambique] está numa boa fase porque surgem novos nomes e novas abordagens. É o momento propenso para acolher uma bienal destas”, acrescenta Quito Tembe. Como exemplo de novos nomes, o curador aponta a bailarina Mai Juli que foi este ano ao Festival de Avignon, em França, como uma das intérpretes da peça “Black Lights”, de Mathilde Monnier, e que começa a dar “os primeiros passos como coreógrafa”. Mai Juli vai apresentar “Sinais Particulares”, a 23 de Novembro, uma peça em que fala sobre o que é ser mulher, jovem e africana, depois de ter, justamente, entrado em “Black Lights”, um espectáculo sobre a permanência das violências sexistas e sexuais contra as mulheres.

O director da Kinani acrescenta que Moçambique está “a viver um momento histórico do ponto de vista de novos artistas que se vão afirmando no continente, e não só, no panorama da dança” e aponta outros nomes já confirmados como Idio Chichava, director artístico da Converge+ Dance Company de Moçambique e que viveu e dançou dez anos em França; Panaibra Gabriel, fundador da Culturarte, a primeira companhia de dança contemporânea de Moçambique, em 1998; e Horácio Macuacua, também membro fundador da Culturarte.

Idio Chichava vai levar a palco, a 23 de Novembro, a peça “Vagabundus” que fala sobre mobilidade, fronteiras e redistribuição espacial dos grupos sociais.

Idio Chichava vem com uma nova abordagem que é olhar para a dança sob o ponto de vista local, despido de todo o compromisso estético internacional. Ele não está com uma linguagem que eu diria aceite do ponto de vista do mercado, mas sim uma linguagem local e uma linguagem que rompe este lugar do ideal para a internacionalização. Fico entusiasmado em falar dele porque ele viveu dez anos em França e a abordagem que ele traz é completamente oposta ao que nós esperaríamos de um artista que esteve a viver dez anos na Europa. É uma nova linguagem, é uma nova forma de estar na dança que me enche de muito orgulho”, continua Quito Tembe.

Horácio Macuacua vai apresentar “Abertura”, a 20 de Novembro, procurando ir “para além” das formas e das normas estabelecidas. “Horácio Macuacua também tem um percurso europeu, a nível da formação, com David Zambrano. Traz-nos o que eu chamo de caos, que é como é que ele olha para a dança contemporânea sob o ponto de vista local. Então, traz-nos um caos que é esta miscelânea e este buscar de raízes na dança tradicional, uma linguagem própria que o caracteriza”, acrescenta o director do Kinani.

Panaibra Gabriel, “um artista estabelecido no panorama internacional”, vai fechar a Biennale de Danse en Afrique, a 26 de Novembro, com a estreia de “Mentiras Aplaudidas”, uma peça para repensar as narrativas históricas e pensada por um coreógrafo que tem puxado para a dança as convulsões pós-coloniais de Moçambique.

“Para além” dos artistas moçambicanos, há coreógrafos e bailarinos de todo o continente porque o objectivo foi representar “o mapa do continente africano” em termos de artistas e de temas, ou seja, “ver o que é que se discute no norte, o que é que se discute no centro, o que é se discute no sul, o que é que se discute no Oceano Índico”.

Quito Tembe é, também, um dos cinco comissários do Fórum de Curadores Internacionais da Bienal de Dança de Lyon, um grupo que está a preparar projectos para a próxima edição de 2025. Tiago Guedes, o director da bienal francesa, vai estar em Maputo para a bienal africana e Quito Tembe admite que “parte dos artistas que aqui vão passar, certamente são artistas que se vai poder ver na Bienal de Lyon”.

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