Acesso ao principal conteúdo
Convidado

“Last Things”: um filme em que “as rochas são as contadoras de histórias”

Publicado a:

O filme “Last Things”, da artista e cineasta Deborah Stratman, com co-produção portuguesa, é uma das obras em competição no Festival Internacional do Documentário Cinéma du Réel, em Paris. “Last Things” fala sobre a evolução e a extinção do ponto de vista das rochas e da geobiosfera, onde a vida perdura mesmo após o desaparecimento dos humanos. “As rochas são as contadoras de histórias”, resume Deborah Stratman à RFI.

Imagem do filme "Last Things" de Deborah Stratman.
Imagem do filme "Last Things" de Deborah Stratman. © Deborah Stratman
Publicidade

A conversa, no Centro Pompidou, onde decorre o Cinéma du Réel, começa com uma tentativa de resumir esta obra, “Last Things”. “Eu diria que é sobre o antes do começo e também sobre o depois do fim, e talvez uma espécie de presente eterno também. É sobre a extinção, é sobre a evolução e como ter uma perspectiva que é mais longa ou maior do que a compreensão humana normal do tempo”, começa por contar a artista e cineasta norte-americana Deborah Stratman.

“Considero as rochas como as minhas contadoras de histórias, de certa forma, ou como as minhas companheiras de histórias porque elas têm um conhecimento do tempo que é muito mais longo do que o conhecimento humano do tempo”, acrescenta.

O documentário é uma colagem de temporalidades, sons e imagens, umas figurativas e outras mais abstractas, oriundas de arquivos e de filmagens no terreno. Entre representações de pedras, de paisagens lunares, das profundezas dos oceanos e de espaços indefinidos. Deborah Stratman cria uma outra narrativa assente na ideia de que existe, nas rochas, uma outra história de evolução. Por um lado, uma geóloga explica cada pedra como um pequeno mundo que carrega uma história que nos ultrapassa. Por outro, a cineasta francesa Valérie Massadian narra uma história inspirada em contos de proto-ficção científica de J.-H. Rosny – pseudónimo dos irmãos Boex que imaginaram, no final do século XIX, extraterrestres de natureza mineral ou geométrica. A tudo se junta uma arquitectura sonora experimental e elástica.

É diferente. Eu diria que é uma espécie de colagem porque vai buscar texturas e temporalidades a muitas fontes diferentes. Então, é muito citacional como quando você é um músico e trabalha com 'samples', o filme funciona um pouco dessa forma. Eu mesma toco alguns dos instrumentos, mas também aproveito de uma grande reserva de alguns materiais científicos, alguns materiais de arquivo, alguns materiais que encontro, desenhos online... É muito ecléctico na textura visual e sonora. Colagem é a maneira mais simples de descrever a forma deste ensaio”, explica a artista.

O filme, que também passou pelo Festival de Cinema de Berlim, é uma co-produção entre a produtora norte-americana Pythagoras Film, a portuguesa Stenar Projects e a francesa Elinka Films. O documentário tem imagens filmadas na Jordânia, nos Estados Unidos e em Portugal, nomeadamente no cromeleque dos Almendres, na Casa do Penedo e na Casa do Xisto, numa rodagem que surgiu durante uma viagem a Portugal.

Não estava previsto filmar na Caso do Xisto, mas depois achei que havia uma parede de xisto bonita e que devia filmar. Era tão perto do Caso do Penedo que perguntei a todos se podíamos fazer uma viagem de investigação. Porque eu realmente queria filmar essa linda casa de pedra (…) Eu sabia que ia filmar algumas grutas e o cromeleque dos Almendres. Entretanto, procurei se havia casas de pedra porque eu sabia que haveria uma pequena parte do filme com casas de pedra. Temos Petra e algumas ruínas Anasazi do sudoeste dos Estados Unidos, que era uma cultura antiga, uma cultura indígena que tinha esse tipo de casa cilíndrica e com habitações nas paredes das rochas. Então, vi, por acaso, uma imagem da Casa do Penedo e pensei: ‘Uau! Temos de ir lá!’", recorda.

A dada altura, no filme, ouve-se que “o planeta deixou prosperar o homem e o homem se tornou destruidor da vida”,  contra os séculos e séculos de vida geológica e animal. Um simples alerta para que a humanidade se ponha no seu devido lugar. Para a cineasta, “há esperança para seres vivos bióticos", mas essa esperança é reduzida no que toca à humanidade.  Essa constatação, porém, não a desespera.

"Sou humana e tenho uma perspectiva humanista e ficaria feliz se nossa espécie pudesse aguentar um pouco mais, mas também tenho empatia por espécies não humanas e sinto-me muito comovida com as evoluções em massa e extinções em massa que aconteceram antes. Alguns dizem que foram seis, alguns dizem que foram muitas mais... Acho que ajuda a ter algum recuo. Não que esse recuo me dê esperança, mas ter uma perspectiva um pouco menos humana sobre o nosso lugar em biliões de anos é mais saudável para mim", afirma.

O documentário “Last Things”, de Deborah Stratman, está em competição no Cinéma du Réel em Paris, que começou a 24 de Fevereiro e termina a 2 de Abril. A cineasta vai também participar na edição deste ano Festival de Curtas-Metragens português Curtas-Vila do Conde, onde é presença regular.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe toda a actualidade internacional fazendo download da aplicação RFI

Ver os demais episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual pretende aceder não existe ou já não está disponível.