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Fondation Villa Datris homenageia arte cinética no sul de França

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A Fondation Villa Datris, em Isle-sur-la-Sorgue, no sul de França, tem patente, de 19 de Maio a 1 de Novembro, a exposição “Mouvement et Lumière” [“Movimento e Luz”] com obras de 60 artistas. A exposição é uma homenagem aos precursores, protagonistas e herdeiros da arte cinética e junta obras, por exemplo, de Jesús-Rafael Soto, Victor Vasarely, Julio Le Parc e Olafur Eliasson. O brasileiro Jaildo Marinho também apresenta duas peças e esteve à conversa com a RFI.

Jaildo Marinho, Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023.
Jaildo Marinho, Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023. © RFI/Carina Branco
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A mostra “Movimento e Luz”, na Fondation Villa Datris, em Isle-sur-la-Sorgue, propõe uma imersão na arte cinética, dos seus primórdios aos ecos mais actuais.

A exposição começa com a imersão num dos “penetráveis” do artista venezuelano Jesús-Rafael Soto, um convite para o visitante se perder nos meandros do movimento de imensas linhas verticais azuis dentro de um cubo sem paredes ao ar livre. Ao lado, está uma escultura de Jaildo Marinho, em mármore e com ligeiros toques de cor, a sugerir movimento e a questionar a aparente permanência das formas geométricas. Estas duas obras dão, logo na entrada, o tom lúdico a uma exposição imersiva e contemplativa que ocupa três andares de uma casa oitocentista e, depois, o seu próprio jardim.

 

Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023.
Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023. © RFI/Carina Branco

 

Mouvement et Lumière” junta obras de protagonistas da arte cinética dos anos 50, como Jesús-Rafael Soto, Victor Vasarely e Yaacov Adam, assim como da Op Art e da arte minimalista dos anos 60, como Julio Le Parc, Bridget Riley, François Morellet e Dan Flavin. A mostra não esquece um dos pioneiros das experimentações do movimento e da luz, Alexander Calder, para chegar aos herdeiros de hoje, com peças de Philippe Parreno, Xavier Veilhan, Olafur Eliasson, Marina Apollonio, Andrea Bowers, Elias Crespin, Jaildo Marinho, entre tantos outros.

Dez anos depois de uma primeira mostra homónima dedicada a este movimento, a fundação repete a aposta, orientando as escolhas das obras com temas que ecoam com 2023, como a urgência ecológica e a omnipresença da tecnologia. Algumas salas são dedicadas integralmente a uma obra para uma imersão completa e um contacto no escuro com formas móveis, florescentes e poéticas, como “Sphère Bleue” [2013] de Julio Le Parc ou “TriAlineados Fluo Vert” [2016] de Elias Crespin.

 

“Sphère Bleue” [2013] de Julio Le Parc.
“Sphère Bleue” [2013] de Julio Le Parc. RFI/Carina Branco

 

“TriAlineados Fluo Vert” [2016] de Elias Crespin
“TriAlineados Fluo Vert” [2016] de Elias Crespin © RFI/Carina Branco

 

O brasileiro Jaildo Marinho, a residir em Paris há 30 anos, já tinha participado na primeira exposição em 2013, voltou a ser convidado e apresenta duas obras. A primeira acolhe o visitante à entrada, no exterior, em frente à peça monumental de Jesus Rafael Soto. 

Tres Stelas, Bonnieux” é uma escultura em grande formato, em mármore de Carrara, em que três quadros parecem ter sido apanhados em flagrante movimento diagonal em cima de uma base maciça rectangular. A versão inicial era feita de resina e, na altura, os fundadores da Villa Datris, Danièle Marcovici e Tristan Fourtine, encomendaram-lhe uma peça semelhante em mármore. “Foi aí que eu tomei a decisão de fazer o diálogo entre os quadrados, onde tem um jogo de diagonais que vem enquadrar o vazio. O mármore representa a eternidade e a cor vinha dar um toque mais contemporâneo, mas que representava a vida e que um dia iria desaparecer”, explica o artista.

Artista Jaildo Marinho. Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023.
Artista Jaildo Marinho. Fondation Villa Datris, França, 17 de Maio de 2023. © RFI/Carina Branco

O mármore já faz parte do seu ADN, assim como a transformação deste material pesado em algo aparentemente leve. “O meu trabalho é uma leveza de toneladas”, resume o artista, acrescentando que também altera o carácter austero e frio do mármore com os apontamentos de cor capazes de lhe darem uma “outra temperatura”. Por isso, Jaildo Marinho nega que o mármore seja clássico, ainda que tenha um carácter de eternidade. Tanto é que, para ele, Auguste Rodin “foi o pai da arte moderna”, assim como Brancusi. Mais uma vez, o mármore resiste ao tempo, persiste nos ateliers e “nunca vai envelhecer” porque “o que muda é o conceito e as técnicas e sempre será uma matéria actual e inspiradora”.

A outra peça que apresenta na Fundação Villa Datris é uma pintura que questiona a própria noção de pintura. Ainda que ele diga que alguns colecionadores olham para a sua pintura como “uma escultura que vai à parede”, esta parte do seu trabalho é mesmo a pintura a olhar para si própria e a extrapolar o seu papel de tela que contém um espaço, cores e um desenho porque o que esta obra mostra “é o infinito”.

Eu abro o quadro para a gente ver o que está por detrás da pintura. Se essa pintura estiver numa parede de vidro, o que se passa é o quotidiano, o dia-a-dia. Então, é uma pintura que se transforma a cada instante. Eu mostro o que se passa por trás da pintura, não mostrar apenas a superfície, mas também o interior, a alma da própria arte”, explica.

 

Pintura de Jaildo Marinho na Fondation Villa Datris. 17 de Maio de 2023.
Pintura de Jaildo Marinho na Fondation Villa Datris. 17 de Maio de 2023. © RFI/Carina Branco

 

A noção de vazio é uma constante no trabalho de Jaildo Marinho que se inspira no seu Brasil natal. “Eu venho de uma região do Brasil, do nordeste, que é uma região muito árida e, praticamente, não tem nada. Foi daí que surgiu essa ideia de eu desenvolver essa pesquisa sobre o vazio e poder enquadrar o vazio da vida, ao vazio”, descreve. Em termos plásticos, a sua pesquisa também tem perseguido esse conceito do vazio, daí ter enveredado por um vocabulário geométrico e ter assumido o legado dos movimentos MADI e Neoconcreto.

Jaildo Marinho trocou o nordeste brasileiro pela capital francesa em 1993 e acredita que “Paris nunca vai deixar de ser uma cidade-luz”, ainda que a cidade há muito tenha perdido o estatuto de epicentro da criação artística. O que fica é a oferta dos tantos museus e as mil e uma possibilidades que se abrem aos artistas aí residentes de reverem os mestres e descobrirem as propostas dos artistas emergentes. Jaildo cumpre, também, o que chama de tradição de artistas brasileiros de rumarem a Paris, como Cícero Dias.

Curiosamente, o escultor tem o seu atelier, há 30 anos, na "colina Rodin". E foi, também, em Paris que conheceu o seu outro “mestre”: Jesus Rafael Soto. “Eu acho que essa geração de arte abstracta, geométrica, dos anos 90 para cá, eu acho que todos são filhos do Soto, como do Malevitch, do Rodtchenko... O Soto tem uma influência muito forte no meu trabalho porque o conheci e convivi com ele no atelier”, recorda.

Desses tempos, além da influência plástica, herdou “a humildade”, “o respeito dos outros artistas, do ser humano” e a vontade de “fazer uma obra que possa agradar a todos, até às crianças”. No fundo, e de um modo geral, Jaildo Marinho diz que a sua obra representa “pureza, sinceridade e respeito porque é feita com muita humildade, amor e determinação”.

Jaildo Marinho tem também patente, de 15 de Junho a 29 de Julho, a exposição individual “Grand Angle”, na Galeria Wagner. Há, ainda, obras na Maison Louis Carré, em Bazoches-sur-Guyonne, até 3 de Setembro, numa casa desenhada pelo arquitecto Alvar Aalto e em que o desafio é “dialogar com a arquitectura de curvas” do arquitecto finlandês, tanto mais que Jaildo Marinho associa o desenho da curva à sensualidade do Brasil.

Em Setembro, vai participar na feira ArtRio, no Rio de Janeiro, e também concluiu uma obra permanente para Brasília. Está, ainda, a preparar um projecto para Janeiro, em Lisboa, em homenagem ao rei português Dom Sebastião, com mármore também português.

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