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Artes

Globalisto, um mundo sem fronteiras de Mo Laudi

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Até ao mês de Outubro, o Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Saint-Étienne Metrópole acolhe a exposição “Globalisto, uma filosofia em Movimento”. África assume honras de destaque, com dezenove artistas africanos ou das diásporas a marcar presença no certame. 

As três obras de Raphaël Barontini patentes no MAMC.
As três obras de Raphaël Barontini patentes no MAMC. © Cristiana Soares
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Recontar e misturar a negritude, o mundo sob a lente panafricanista, a criação de uma visão alternativa no caminho da transformação, inclusão e gratidão, foram os pontos de partida do artista sul-africano Mo Laudi, curador de exposição

A palavra Globalisto foi criada por mim. Ao longo da minha vida tenho pensado numa filosofia de como podemos realmente ver o mundo de uma perspectiva diferente. 

Se olharmos para o mundo como ele é, a história do mundo é escrita a partir da Europa. É uma perspectiva centrada no ocidente. 

Mesmo em África, há uma tendência para uma abordagem mais europeia de ver o mundo. 

Então, eu questionava-me: como podemos olhar para o mundo a partir da perspectiva nigeriana ou sul-africana e depois juntar tudo?

Foi aí que nasceu a ideia de Globalisto, um mundo sem fronteiras. Um mundo sem fronteiras porque todas as fronteiras de África foram criadas por poderes europeus.

Ao longo dos anos, especialmente nos últimos anos, vemos o que o movimento Black Lives Matter tem feito em termos de cultura popular, tornando as pessoas conscientes da situação dos negros no mundo. 

Com esta exposição quero continuar essa conversa sobre a mudança, engajar e conectar a diáspora. 

Em vez de ficarmos agarrados ao passado, qual é a solução que podemos criar? Em vez de nos cancelarmos, como nos podemos aconselhar, como podemos reparar os danos e como nos podemos realmente ajudar mutuamente? É sobre estender a mão.

Em África há um ditado que diz que são precisas duas mãos para fazer barulho, o que significa que devemos trabalhar juntos. Trabalhar em conjunto é sempre melhor”.

A participar nesta exposição estão dezanove artistas. Josèfa Ntjam é uma jovem artista francesa de origem camaronesa, residente em Saint-Etienne. 

Nos seus trabalhos, mistura múltiplos conceitos, evocando a mitologia mágica africana, os rituais ancestrais, os símbolos religiosos, a ciência e a filosofia. 

Uma das peças que nos apresenta chama-se “Simulacro”.

Resinas, impressões em papel de arroz congeladas na resina, foi assim que construí esta peça. Chama-se “Simulacro” e diz respeito a 1 de Janeiro de 1960, dia da independência dos Camarões. 

“Simulacro”, porque é uma independência que, na verdade, nunca aconteceu e aqui tudo fica congelado numa espécie de ecossistema, de micro-organismos. 

São muitas fotografias microscópicas, que sou eu que tiro, imagens 3D, modelos 3D, arquivos de família... como se pode ver pelos rostos que estão à esquerda”. 

Marie Aimée Fattouche inspira-se nos seus antepassados e na sua genealogia egípcia. Os seus trabalhos questionam recorrentemente o feminismo, os sistemas de poder e as crenças.

Através da interpretação e apropriação da fábula de “A panela de barro e a panela de ferro”, Marie Aimée Fattouche desafia-nos a ir além das ideias e dos conceitos pré-concebidos. 

Para esta exposição, trabalhei sobre um texto que já foi trabalhado várias vezes ao longo da história. Por exemplo, na Bíblia, no livro da Sabedoria e por La Fontaine. 

É a fábula de “A panela de barro e a panela de ferro”. Esta fábula, desde o século IV a.c., tem sempre a mesma conclusão: associem-se apenas com os vossos pares.

E assim é, fomos instruídos pela nossa educação e por religiões a só nos associamos com nossos iguais.

Aqui estou eu a propor uma panela de barro e um panela de ferro, que podem viajar juntas e que se reinterpretam. Têm consciência da sua natureza diferente, mas reinterpretam a sua construção para poderem viajar juntas. 

Também propus uma reescrita inclusiva da própria fábula. A inclusão precisa ser feita em diferentes níveis e este foi um trabalho inédito para mim”.

Raphaël Barontini, vive e trabalha em Saint-Denis, na região parisiense. Nas suas obras questiona o domínio ocidental na história da arte africana. Na série que aqui apresenta, mostra-nos heróis imaginários ou reais de África e das Caraíbas, com o objectivo de realçar personagens historicamente sub-representadas. 

Apresento aqui três obras têxteis, que integram esta estética da colagem, num fundo que é uma impressão digital. 

O que caracteriza estes trabalhos, é claro, a escala. De facto, a escala, este tamanho enorme, também está em conexão com o assunto. 

Desde há muito tempo, que no meu trabalho, misturo retratos de personagens imaginários, sem identidade, com retratos históricos muito precisos, de figuras históricas, em particular das Caraíbas. 

A maior tela, ali ao fundo, é um retrato imaginário de tudo isso. A da esquerda chama-se “Black Centurion”. É uma evocação da figura de São Maurício, que era o único santo no cristianismo a ter a pele negra. 

Na história da pintura clássica, nas pinturas do século XV, XVI e XVII, aparece a figura deste Cavaleiro Negro. São Maurício é uma das únicas figuras negras apresentadas de forma positiva”.

A integrar este painel de artistas, está também a moçambicana Eurídice Zaituna Kala que ao microfone da RFI explicou como surgiu o convite. 

Conheço Mo Laudi, desde há alguns anos e temos afinidades. Acho que este convite chega até mim a partir de certas afinidades na reflexão da arte africana no contexto europeu”. 

A exposição “Globalisto, uma filosofia em Movimento” está patente ao público no Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Saint-Étienne Metrópole até dia 16 de Outubro.

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