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“Faz todo o sentido” encenar Molière em Cabo Verde

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“O teatro necessita dos clássicos” e de Molière ainda mais. Quem o diz é a actriz Fidélia Fonseca que interpretou uma das personagens principais na peça “Escola de Mulheres”, encenada por João Branco e levada a palco pelo Grupo de Teatro do Centro Cultural Português do Mindelo. Esta companhia cabo-verdiana já tinha “crioulizado” Molière com a obra “Médico à Força”, em 2000, e voltou a apropriar-se do dramaturgo francês em 2013 e 2017.

A actriz Fidélia Fonseca na ALAIM (Academia Livre de Artes Integradas do Mindelo). Ilha de São Vicente, Cabo Verde. 22 de Março de 2022.
A actriz Fidélia Fonseca na ALAIM (Academia Livre de Artes Integradas do Mindelo). Ilha de São Vicente, Cabo Verde. 22 de Março de 2022. © Carina Branco/RFI
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Até que ponto o teatro de Molière faz sentido em Cabo Verde hoje em dia? Primeiro porque é um clássico mas “não deixa de ser actual”. Depois, porque é simplesmente comédia. “Faz todo o sentido do mundo porque, para já, somos um povo aberto. Gostamos da comédia e o público mindelense identifica-se com a comédia. Molière foi um fenómeno e nós sentimo-nos identificados com esse tipo de comédia”, responde Fidélia Fonseca.

A actriz interpretou Inês, de "Escola de Mulheres", em 2019, já que a primeira apresentação da peça tinha ocorrido em 2013 e a sua personagem era então incarnada por Elba Lima. Transformar uma francesa do século XVII em uma cabo-verdiana do início do século XX “foi desafiador” para Fidélia porque se trata de “uma menina muito submissa” que não corresponde propriamente aos cânones da juventude moderna e “não tem nada a ver com a Fidélia, nada mesmo”.

No entanto, o texto é alterado no final e a mulher submissa torna-se na mulher forte. “Faz aquele choque. Será que é uma mulher de há 300 anos ou será que é uma mulher do século XXI?”, lança a actriz que brincou com esse paradoxo em palco.

Na ‘Escola de Mulheres’ o nome já diz tudo: temos a mulher submissa, em casa, a fazer costura. No final, acaba por cansar e dizer ‘Não, eu vou fazer o meu caminho e ir com os meu próprios pés. Não quero mais. Chega. E mesmo sendo um texto com uns anos, não deixa de ser um tema actual”, explica.

A “Escola de Mulheres” foi encenada como se se desenrolasse na cidade do Mindelo, no princípio do século XX, e como se fosse uma comédia a preto e branco, em homenagem ao cinema mudo.

Fidélia Fonseca falava em crioulo mas com um sotaque oriental porque todas as personagens tinham sotaques internacionais que remetiam para os tempos áureos do Porto Grande face à passagem permanente de estrangeiros oriundos dos barcos e aos mercadores que aí se instalavam.

Nós, os mindelenses, somos um povo muito aberto. Temos um pouco de tudo aqui. Conhecemos japoneses, conhecemos franceses, italianos, brasileiros (...) Digamos que é uma forma de homenagear os que vieram na nossa terra”, conta Fidélia, sublinhando que “pode até ter sotaque, mas é tudo em crioulo” para não renunciar à cabo-verdianidade.

Conseguimos crioulizar Molière e não foi assim tão difícil. Temos outras obras de Shakespeare, Kafka que também foram crioulizados”, acrescenta.

Todo o espectáculo era acompanhado por música ao vivo, igualmente numa homenagem ao Mindelo e aos seus ritmos. Em palco, esteva sempre o pianista Khali Angel, mas também havia mornas e coladeiras com letras do texto de Molière. Ou seja, não só Molière foi “crioulizado” como também foi “musicado” com ritmos cabo-verdianos.

Oiça aqui a entrevista.

09:26

Fidelia Fonseca, a Inês da "Escola de Mulheres" de Molière

Pode também ouvir, nas páginas dedicadas, as entrevistas ao encenador João Branco e aos actores Rank Gonçalves, Janaína Alves e Zenaida Alfama.

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