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Argélia/Mali

Entenda o conflito no Mali e a geopolítica do Sahel

Na quarta-feira, radicais islâmicos fizeram um número ainda indeterminado de reféns de pelo menos dez nacionalidades no campo de gás, de In Amenas, no leste da Argélia, próximo da fronteira com a Líbia, para exigir o fim da operação militar francesa no Mali, que já dura oito dias. O local explorado pela petrolífera britânica BP, pela norueguesa Statoil e a argelina Sonatrach foi invadido por membros do grupo radical islâmico al-Mulathamin fortemente armados, que detiveram parte dos funcionários presentes. Na quinta-feira, o exército da Argélia cercou e atacou a área para libertar os sequestrados. A operação de resgate lançada pelos argelinos, sem a participação dos países de origem de parte dos reféns, foi alvo de críticas da comunidade internacional e provocou a morte de um número ainda incerto de pessoas. A primeira informação da segurança argelina indica que 639 dos sequestrados foram liberados, entre eles 66 estrangeiros, mas a operação militar ainda não foi concluída.

Mapa do Mali, onde as tropas francesas realizam seu oitavo dia de operação para combater grupos radicais islâmicos.
Mapa do Mali, onde as tropas francesas realizam seu oitavo dia de operação para combater grupos radicais islâmicos. RFI
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Por que o Mali é palco de conflito armado?

O país da Africa do Oeste, possui 12 milhões de habitantes em um território duas vezes maior que o da França. A região sul do país, que gira em torno da capital Bamako, é conhecida como o “Mali verde”, devido à abundante presença de vegetação em torno do rio Niger. É nessa área que estão concentradas 90% da população do país, majoritariamente composta por negros. O norte fica em parte no Sahel, faixa territorial de transição entre as savanas subsaarianas e o deserto, e a outra parte integra a maior zona desértica do mundo, o Saara. Essa região árida e pouco habitada chamada de Azawad é ocupada por uma minoria de árabes e tuaregues, povo de origem nômade. Desde a criação da República do Mali, com o fim da colonização francesa em 1960, um movimento separatista reivindica a independência da região. Mas a zona de ocupação dos tuaregues ultrapassa as fronteiras do Mali, entrando na Argélia, no Niger e na Líbia. Pouco controlada pelo Estado, a região norte do país é um corredor de passagem para o tráfico de pessoas, armas e drogas.

Quais as milícias que atuam na região?

Parte do Saara, o Sahel e especificamente o norte do Mali constituem a área de ação da Aqmi, Al Qaeda para o Magrebe Islâmico. O grupo radical islâmico, braço africano do grupo terrorista Al Qaeda, já executou mais de 80 sequestros na região desde 2007. Com a queda do governo de Muammar Kadafi, após a entrada das forças da Otan, Organização do Tratado do Atlântico Norte, na Líbia em 2011, as tropas tuaregues, antes engajadas pelo ex-governo líbio, retornaram para a região desértica da Azawad, no norte do Mali, fortalecidos e com novas armas. O movimento de liberação da região chamado de “rebelião tuaregue” ou “guerra de Azawad”, existente desde a independência do Mali, é reativado com a fusão do Movimento Nacional do Azawad (MNA) e o grupo armado Movimento Tuaregue do Norte do Mali (MTNM) criando o Movimento de liberação da Azawad (MNLA), que ataca o mal equipado exército malinês. O ataque ao campo de gás em retaliação à entrada das tropas francesa no território malinês foi executado pelo grupo al-Mulathamin, dirigido por Mokhtar Bel Mokhtar, ex-chefe da Aqmi.

Como aconteceu a intervenção francesa?

Em 22 de março de 2012, o exército depois de diversas derrotas para as forças radicais islâmicas decide derrubar o governo do presidente do Mali, Amadou Touré. Em abril, o MNLA declara a independência do Azawad. Além do grupo separatista, luta ao seu lado a milícia tuaregue,  Ansar Dine (Defensores do Islã), que defende o islamismo radical e quer impor a charia, lei islâmica, à população local. Os dois entraram em conflito pela administração da área. O governo enfraquecido do Mali e a crescente instabilidade da zona permitem a expansão do poder de grupos radicais islâmicos armados, como o Movimento pela unidade e pela Jihad na Africa do Oeste (Mujao).

Os países vizinhos, Burkina Faso, Mauritânia, Niger e Argélia recebem o fluxo de refugiados do Mali, 150 mil pessoas no último ano, segundo dados da ONU, e começam a se preocupar com o risco de contágio do conflito. O número de pessoas que estão deixando o norte do Mali em direção a outras localidades dentro do próprio país chega a 230 mil.

No dia 10 de janeiro de 2013, os rebeldes ultrapassam a linha invisível que divide o norte e o sul do país, com a tomada da cidade de Konna, e seguem a rota em direção a capital malinesa. A ação desencadeia no dia seguinte a intervenção militar francesa, a pedido do governo interino do Mali. A operação “Serval” obteve o acordo do Conselho de Segurança da ONU e da Comunidade Econômica de Estados da Africa do Oeste (Cedeao).

No Mali, as tropas francesas realizam o seu oitavo dia da intervenção, que conta com a colaboração de tropas africanas e com o apoio logístico da aviação americana, espanhola e alemã. Na quinta-feira a União Europeia aprovou o enviou de 450 militares, dentre eles 200 instrutores, a partir de fevereiro. O projeto vai custar 12 milhões de euros e tem duração inicial de 15 meses. Já as tropas da Cedeao também são esperadas, a partir da próxima semana, para reforçar o combate contra os radicais islâmicos.

Por que a Argélia é importante no conflito?

Maior potência regional e o maior país africano em extensão de território, a ex-colônia francesa possui 35 milhões de habitantes. Situada estrategicamente no coração do Magrebe, entre a Tunísia, o Marrocos, seu principal rival na hegemonia regional, e a Líbia, palco da última invasão das forças da Otan, lideradas pela França, Inglaterra e Estados Unidos, para lutar contra as tropas do ditador Kadafi, que dirigiu o país por mais de 40 anos. Oitavo produtor mundial de gás natural, essa atividade junto com o petróleo representa 49% das exportações do país.

A Argélia possui mais de 1.300km de uma fronteira porosa com o Mali, em pleno deserto, e é o único país da região que não apoiou a operação militar francesa em seu vizinho. O governo do presidente argelino, Abdelaziz Bouteflika, permitiu apenas que caças da aeronáutica francesa sobrevoassem seu território para ter acesso às zonas de conflito. O país foi palco de diversos atentados recentes. Na cidade de Tamanrasset, no sul da Argélia, foi criado o centro de gestão do mecanismo criado por cinco países para combater o terrorismo no Sahel.
 

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