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Angola: ONG’s pedem alargamento do prazo de registo eleitoral

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Em Angola, nove organizações não-governamentais angolanas e membros da sociedade civil enviaram uma carta ao executivo angolano para que prolongue o prazo para o registo eleitoral, que termina esta quinta-feira, por mais 30 dias, face à “insatisfação exposta em Angola e na diáspora”. Laura Macedo, uma das signatárias do abaixo assinado, denuncia anomalias no processo de registo eleitoral e um mau funcionamento dos balcões de atendimento.

Angola: ONG e sociedade civil pedem alargamento do prazo eleitoral.
Angola: ONG e sociedade civil pedem alargamento do prazo eleitoral. © RFI
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RFI: O que é que vocês pretendem com esta carta enviada ao ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, Marcy Lopes?

Laura Macedo: O que pretendemos realmente é um adiamento da data- que termina hoje- e que seja prorrogado o prazo para o registo eleitoral, em virtude de muita gente não ter conseguido registar-se.

E as pessoas não se conseguiram registar porquê? Os BUAP- Balcões Únicos de Atendimento Público-, que são os os locais arranjados pelo governo para que fosse feito o registo, não são suficientes. Em Benfica, que tem uma densidade populacional muito grande, só há um BUAP a funcionar, tornando o processo muito moroso. Centenas de pessoas deslocam-se, todos os dias, a estes centros, mas apenas trinta e cinco pessoas conseguem registar-se.  

O que está a dizer é que esses centros não são suficientes para satisfazer a procura crescente dos eleitores?

Não, não são. Para além de que estão a criar também muitas dificuldades ao cidadão.

E refere-se a que tipo de dificuldades?

Um jovem de cabelo comprido, que não tenha o cabelo cortado à escovinha, não lhe é permitido entrar no BUAP. Um indivíduo que não tenha o cartão de vacina contra a Covid-19 também não pode registar-se.

Convém explicar que muitas destas pessoas não foram vacinadas, não por opção própria, (mas sim) porque ainda não tiveram oportunidade de receber a vacina...

Nós temos postos de vacinas aqui no Asfalto, baixa da cidade. Não vemos um posto de vacinação de Covid-19 nos bairros da periferia. Então, como é que podemos exigir que os jovens que vivem na periferia, jovens que estão desempregados, que são sustentados pelas mães- cuja profissão é serem vendedoras ambulantes- tenham dinheiro para se deslocarem até à baixa da cidade para se vacinarem? No município onde vivem, no seu bairro não há postos de vacinação e exige-se que seja apresentado um cartão de vacina contra a Covid-19 para que possam exercer um direito que é de todos os cidadãos.

Pedem a prorrogação por trinta dias e falam em anomalias. Já aqui descreveu algumas situações, mas que outro tipo de anomalias têm sido detectadas?

Dificuldades nos BUAP- organismo montado pelo Ministério da Administração do Território- que por vezes têm sistema e em outras alturas deixam de ter. Por exemplo, nós temos muitos jovens que foram registados, mas não receberam nenhum cartão. Eles estão a exigir que as pessoas façam registo como munícipe, porém a lei não prevê que o cartão de munícipe sirva para votar. Tem que se ter o cartão eleitoral e eles não o estão a dar. Há uma uma série de anomalias que ninguém está a entender. Nós temos estado a questionar o ministério.

Qual é a justificação dada pelo ministério?

Nós ouvimos o ministério através da imprensa e o que eles dizem é que está tudo a correr bem, quando nós, no terreno, constatamos que está tudo a correr muito mal.

Este abaixo-assinado aponta a insatisfação exposta em Angola, mas também na diáspora. Também no estrangeiro, os balcões únicos de atendimento ao público não estão a ser capazes de dar resposta?

Eu acho que nem estão a funcionar ainda. Eu acho que ninguém na diáspora foi registado.

Como é que se explica essa situação?

Esse é o problema! Não conseguimos explicar e queremos essa explicação. Como é que vai haver voto na diáspora sem se ter efectuado o registo eleitoral na diáspora? O que nós ouvimos dizer é que nos consolados se está a convidar os cidadãos a tirar o bilhete de identidade. O bilhete de identidade, por si só, não dá acesso à mesa de voto!

Então é isso tudo que se está a passar e nós não entendemos. Temos estado a questionar, não temos resposta, e então daí com o apoio da Frente Friends of Angola saiu esta carta.

Em que medida é que o alargamento a novos círculos eleitorais da diáspora pode significar um risco acrescido da transparência do processo eleitoral?

Nós nem sabemos bem como é que [o processo] vai funcionar na diáspora. O que estamos a ouvir das autoridades angolanas é que vai funcionar nos consulados. Quem é que vai lá estar? Se vai poder haver observação? Se as organizações da sociedade civil na diáspora vão poder colaborar? Não sabemos nada!

Os angolanos da diáspora, que tem a sua sede nos Estados Unidos, são os que mais reclamam, dada a extensão do país e pelo facto de estarem mais dispersos. Será que as pessoas vão ter de se deslocar ao consulado? Só há um consulado nos Estados Unidos e, no Canadá, não há consulado. Quem responde pelos angolanos que vivem no Canadá é o consulado nos Estados Unidos. Quer dizer, os cidadãos que vivem no Canadá vão ter de se deslocar aos Estados Unidos para se registarem e depois voltam no dia da votação? Eles querem realmente que os angolanos da diáspora votem? Eu pessoalmente, acho que está a haver uma má vontade por parte do governo. É mesmo má vontade!

Acredita que a única solução seria alargar o prazo de recenseamento eleitoral?

Alargar e ajustar a forma como estão a funcionar. Acabar com as proibições, abrir novos postos, como sempre fizeram no passado. Desta vez eles resolveram confinar os centros às administrações municipais, montando um gabinete dentro das administrações municipais. O que quer o governo? Na minha opinião, quer provocar uma abstenção já no registo.

Considera que Angola não aprende com os erros do passado? Em 2008, também foi muito criticado o recenseamento eleitoral...

O que nós vemos é que, cada vez mais, há uma má vontade do governo para que os jovens adiram ao processo eleitoral, que exerçam o seu direito de voto. É como se lhes fosse cortado esse direito e não pode ser. Nós todos somos cidadãos, temos os mesmos direitos, então vamos fazer com que todos possamos exercer esse direito.

Se não for prorrogado o prazo, receiam que muitos eleitores possam ser impedidos de votar?

Sim, muitos vão ser impedidos. Se eles não prorrogarem o prazo, se não eliminarem essas proibições, muitos eleitores não poderão exercer o direito de voto.

Pensa que as autoridades poderão voltar atrás nesta decisão?

Se quiserem ser sérias têm de voltar!

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