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Zâmbia

Lusaca, placa giratória das migrações

Lusaca – A Zâmbia está no centro da rota migratória para a África do Sul, segundo eixo mais frequentado do continente após o que se dirige para a Europa. Os exilados assumem todos os riscos para escapar aos conflitos ou à miséria. Sob as pressões europeia e internacional, Lusaca tenta simultaneamente lutar contra os tráficos e organizar os fluxos regulares.

Eixo rodoviário em Lusaca, Zâmbia.
Eixo rodoviário em Lusaca, Zâmbia. Brian Dell/CC/Wikimedia
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Agressões xenófobas multiplicam-se na África austral

 

Num parque automóvel a sul de Lusaca, capital da Zâmbia, dezenas de homens, jovens, vagueiam de braços caídos. Com idades entre os 16 e os 30 anos, são originários da Etiópia, da Somália, do Sudão ou ainda da República Democrática do Congo (RDC). Saco às costas, passaporte no bolso, escrutinam as idas e vindas dos carros que partem regularmente para cidades da África do Sul. Um deles, com uma cicatriz de vários centímetros na cara, olho direito lacerado, aceita falar connosco. «Fui agredido em Mogadíscio. Deixei a Somália por causa da violência.» Com cerca de vinte anos, sempre conheceu o seu país devastado pelos conflitos, tendo-se o Estado afundado em Janeiro de 1991 com o derrube de Mohamed Siad Barre, antes se tornar a ponta-de-lança dos senhores da guerra.

Todos os dias há dezenas destes jovens que se enfiam no vagão de uma viatura pesada. Alguns pagam a passadores. «Estes camiões deviam levar comida para Joanesburgo. Alguns veículos são, na verdade, engodos. Os contrabandistas criam uns porões onde os refugiados são amontoados às dezenas, para assim escaparem aos controlos. O problema: a falta de ar. À chegada, só os mais fortes sobrevivem», revela-nos sob anonimato uma fonte que encontrámos no parque automóvel. Um dos jovens, aparentemente menor, treme de medo. «Não há outros meios para ir para a África do Sul, vou mesmo assim», afirma determinado, apontando para um semi-reboque da década de 1970.

Cada dia é um inferno

Na África austral, os fluxos migratórios são particularmente grandes e complexos, suscitando alguns territórios mais prósperos muitas esperanças, por vezes desmedidas. A África do Sul, segunda maior economia da África subsaariana (419 mil milhares de dólares de produto interno bruto (PIB) em 2021, ou seja, 389 mil milhares de euros), representa mais de dois terços do valor acrescentado regional. Desde os Estados vizinhos até ao Corno de África, a Cidade do Cabo, Durban ou ainda Joanesburgo são como que um eldorado para inúmeros candidatos ao êxodo. A «nação arco-íris» constitui um dos dois grandes pólos de migrações intra-africanas, após a rota que conduz à África do Norte e daí à Europa.

Quarta economia da região (22 mil milhares de dólares em 2021), a Zâmbia está triplamente envolvida no deslocamento das populações, visto que é uma terra de partida, de trânsito e de destino. Em finais de Julho de 2023, o país acolhia 89 109 refugiados, requerentes de asilo e outras pessoas deslocadas. A maioria são originários da RDC, do Burundi, do Ruanda e de Angola. Ao longo da rota para a África do Sul, nem todos convergem para Lusaca pelas mesmas razões. Alguns fogem do autoritarismo ou da insegurança política de países vizinhos, como o Uganda, governado há quarenta anos por Yoweri Museveni, ou Moçambique, a sofrer ataques de grupos islamitas. A Zâmbia é, então, destino final escolhido. Para outros, é apenas uma etapa. A partir do momento em que recuperarem forças ou arranjarem dinheiro suficiente, atravessarão a fronteira do Zimbábue em direcção à África do Sul.

Ali, gerente de um pequeno café-restaurante que fica num grande eixo viário da capital, chegou da Somália há doze anos. «Cada dia era um inferno», recorda entre dois pratos servidos a clientes sentados à mesa no seu modesto estabelecimento. «Parti com os meus filhos porque os Al-Chabab (grupo islamita somaliano criado em 2006 durante a invasão etíope) matavam pessoas nas ruas mesmo ao lado da nossa casa.» Este pai de família encontrou na Zâmbia uma terra mais hospitaleira, onde pensa ficar para sempre: «Agora que tenho trabalho e um título de residência em ordem, porque é que havia de partir para a África do Sul? Estou em minha casa, em Lusaca.» O caso de Ali continua a ser uma excepção na África austral, uma região onde as esperanças de um futuro melhor se voltam frequentemente para a África do Sul. Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), 190 pessoas terão passado todos os dias da Zâmbia para o Zimbábue em Maio de 2023. O corredor migratório entre o Zimbábue e a África do Sul é o mais frequentado da região, com uma média diária de 613 pessoas no mesmo período. «A África do Sul é um grande pólo migratório, desde que se esteja num país africano a Sul do equador e anglófono», sublinha Catherine Wihtol de Wenden, directora de investigação no Centro Nacional de Investigação (...)

Artigo de Le Monde Diplomatique

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